Lula lamenta atraso no acordo Mercosul-UE e condena intervenção na Venezuela

21-12-2025 Domingo

Durante a Cúpula do Mercosul, presidente afirmou que França sozinha não terá poder de barrar o acordo e afirmou que intervenção armada na Venezuela seria catástrofe humanitária

O presidente Lula discursou neste sábado (20) durante a 67ª Cúpula do Mercosul, em Foz do Iguaçu (PR). No encontro, o governo brasileiro passa a presidência temporária do bloco para o Paraguai.

No seu discurso, Lula lamentou que o acordo entre Mercosul e União Europeia não foi assinado durante esta reunião da Cúpula sul-americana. Posteriormente, em coletiva de imprensa, o líder brasileiro foi categórico ao dizer que a França sozinha não conseguirá barrar o acordo.

“Desde 2023, trabalhamos para garantir que o acordo contribuísse para o desenvolvimento econômico do Mercosul, sem afetar políticas industriais e de incentivo à inovação e sem prejudicar setores sensíveis. Aceitamos a adoção de cotas a produtos agropecuários e o estabelecimento de um mecanismo de salvaguardas, resguardando nosso direito de reciprocidade”, disse Lula aos demais líderes sul-americanos.

“Chegamos a um entendimento vantajoso para os dois lados. Tínhamos, em nossas mãos, a oportunidade de transmitir ao mundo mensagem importante em defesa do multilateralismo e de fortalecer nossa posição estratégica em um cenário global cada vez mais competitivo. Mas, infelizmente, a Europa ainda não se decidiu”, completou.

Segundo o presidente brasileiro, líderes europeus pediram mais tempo para discutir medidas adicionais de proteção agrícola. Ele indicou que recebeu uma carta em que os presidentes da Comissão Europeia e do Conselho Europeu demonstram a expectativa de que o acordo seja aprovado em janeiro, colocando fim a 26 anos de negociações.

Como já destacado pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, o bloco sul-americano tem outras demandas além da União Europeia, fato reforçado por Lula. Entre estas agendas estão a ampliação de um acordo com a Índia, tratativas com o Canadá e com os Emirados Árabes Unidos, parcerias com Japão, Vietnã e Panamá, além de atualizações junto a Colômbia e Equador.

Depois do discurso na cúpula, em contato com jornalistas em Foz do Iguaçu, o presidente observou que, isoladamente, franceses não terão força para barrar o acordo.

“Se [o acordo] estiver pronto para assinar e faltar só a França, segundo a Úrsula Von Der Leyen [presidente da Comissão Europeia] e o Antonio Costa [primeiro-ministro de Portugal], não haverá possibilidade de a França, sozinha, não permitir o acordo”, explicou Lula, que espera a assinatura em janeiro pela presidência do Paraguai, com Santiago Peña.

América do Sul

Em outro trecho do discurso, o presidente Lula deixou um recado contra os ataques ao multilateralismo ao destacar que construir uma América do Sul próspera e pacífica é a única doutrina que convém, sem nunca abrir mão da soberania.

Sobre a tensão entre Estados Unidos e Venezuela, Lula condenou qualquer escalada armamentista: “Uma intervenção armada na Venezuela seria uma catástrofe humanitária para o hemisfério e um precedente perigoso para o mundo”.

O presidente ainda ressaltou que a democracia brasileira sobreviveu ao mais duro atentado sofrido desde o fim da ditadura, em referência ao 8 de Janeiro: “Os culpados pela tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023 foram investigados, julgados e condenados conforme o devido processo legal. Pela primeira vez na sua história, o Brasil acertou as contas com o passado”, frisou.

Na questão da segurança pública, um tema comum entre os países do bloco, o líder brasileiro apontou a assinatura do acordo contra o tráfico de pessoas e a criação da comissão para implementar uma estratégia comum contra o crime organizado transnacional.

Segundo Lula, o governo brasileiro em acordo com o uruguaio irá “propor a convocação de uma reunião de ministros da Justiça e de Segurança Pública do Consenso de Brasília para discutir como fortalecer a cooperação sul-americana no combate ao crime organizado.”

Outra agenda fundamental assinalada é o combate à violência contra a mulher: “Enviei, ontem, para a ratificação do Congresso Nacional, acordo que permitirá que mulheres beneficiadas por medidas protetivas em um país do bloco tenham a mesma proteção nos demais países. Gostaria de propor ao Paraguai, que assume hoje a presidência do bloco, que trabalhemos para criar um grande pacto do Mercosul pelo fim do feminicídio e da violência contra as mulheres”, afirmou Lula.

Foto: Ricardo Stuckert / PR

Também foi tratada a possibilidade de a América do Sul ocupar a vanguarda da transição energética. Para tal, é necessário avançar na convergência regulatória, que envolve “minérios críticos, vasto potencial hídrico, solar e eólico, além de uma experiência consolidada na área de biocombustíveis”, bem como na conclusão do programa de Rotas da Integração Sul-Americana (obras de melhoria de rodovias, hidrovias, ferrovias, portos e aeroportos).

“A integração regional só vai ganhar concretude se tiver impacto na vida das pessoas”, exaltou o presidente Lula.

Lula ainda comemorou a construção da Ponte da Integração, entre Foz do Iguaçu e Presidente Franco, no Paraguai, inaugurada na sexta-feira (19): “Em um mundo em que erguer muros parece mais fácil do que construir pontes, esse exemplo merece ser lembrado”, disse o presidente, ao lembrar também dos marcos de construção do Mercosul.

Por fim, ele recordou uma triste lembrança para o Cone Sul, os 50 anos da infame “Operação Condor”.

“Esse episódio terrível da nossa história nos ensinou uma valiosa lição. Se regimes ditatoriais se articularam para perseguir seus cidadãos, cabe aos governos democraticamente eleitos trabalharem juntos para garantir a todos uma vida melhor, com base na promoção e na proteção dos direitos humanos. Mesmo que alguns se mostrem saudosos de antigos ditadores, devemos insistir em caminhar para frente, nunca para trás”, advertiu.

Ainda que não diretamente, o recado serve para os apoiadores da ditadura chilena de Augusto Pinochet, que agora se sentem representados com a eleição de José Antonio Kast.

Vermelho

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