Vitória da democracia: Bolsonaro está inelegível até 2030

30-06-2023 Sexta-feira

Depois de ameaçar o processo eleitoral por inúmeras vezes, ex-presidente é considerado culpado pela maioria do plenário do TSE.

O Tribunal Superior Eleitoral formou, nesta sexta (30) maioria para condenar ex-presidente Jair Bolsonaro por crimes de abuso de poder e uso indevido de meios de comunicação. A decisão colegiada deixa Bolsonaro inelegível até 2030.

Bolsonaro foi processado por deslegitimar o processo eleitoral durante uma reunião convocada pelo ex-presidente a embaixadores no Palácio da Alvorada, em 22 de julho de 2022. No evento, o então presidente e candidato a reeleição mentiu sobre as urnas eletrônicas, chantageou a justiça eleitoral, mencionando sugestões das Forças Armadas, além utilizar aparelho público para atiçar suas bases como estratégia eleitoral.

A maioria no TSE foi formada pelos ministros Benedito Gonçalves, o relator e corregedor-geral da Corte, além dos ministros Floriano Marques, André Ramos, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes. Abriram divergência o ministro Raul Araújo e Nunes Marques.

Walter Braga Netto, que compôs a chapa de Bolsonaro à reeleição, foi excluído da sanção, uma vez que, para o colegiado, não ficou demonstrada sua responsabilidade na conduta. Nesse ponto, a decisão foi unânime.

O julgamento foi encerrado na tarde desta sexta-feira (30) com a proclamação do resultado pelo presidente da Corte, ministro Alexandre de Moraes.

O julgamento foi marcado pelas posições extravagantes da defesa que, admitiram o teor mentiroso do discurso do ex-presidente no Alvorada, no entanto, consideraram as declarações como liberdade de expressão.

O ministro Raul Araújo fala ao lado de Nunes Marques Foto: Antonio Augusto/ TSE

O ministro Raul Araújo, um dos que abriram divergência, chegou a dizer que a transmissão da reunião por uma emissora pública era uma situação normal, uma vez que a agenda do presidente da República possui cobertura da Emissora Brasileira de Comunicação (EBC).

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O relatório demolidor de Benedito Gonçalves

O relator, ministro Benedito Gonçalves, no seu voto, procurou rebater os pontos em que defesa procurou descaracterizar a natureza eleitoral da reunião. “A reunião portanto teve finalidade eleitoral, mirando influenciar o eleitorado e a opinião pública nacional e internacional com uso da estrutura pública e das prerrogativas do cargo de presidente da República foi contaminado por desvio de finalidade em favor da candidatura da chapa investigada”, leu o ministro.

“Os ilícitos perpetrados pessoalmente pelo primeiro investigado [Jair Bolsonaro], na condição de presidente da República, chefe de Estado, candidato à reeleição em 2022, esgarçaram a normalidade democrática e isonomia. Ao propor uma cruzada contra uma inexistente para fraudar as eleições, [ele] não estava perdido em autoengano. Estava fazendo política e estava fazendo campanha. A recusa de valor ao conhecimento técnico a respeito das urnas e a repulsa à autoridade do TSE foram manejadas como ferramentas de engajamento”, completou o relator.

Brasília (DF), 22/06/2023 – O ministro relator, Benedito Gonçalves, durante sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para o julgamento da ação (Aije nº 0600814-85) que pede a inelegibilidade de Jair Bolsonaro e de Walter Braga Netto, candidatos à Presidência da República nas Eleições 2022. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Além do abuso de poder político, o ministro Benedito Gonçalves ainda contra-argumentou as posições da defesa do ex-presidente quanto a naturalização da transmissão da reunião com os embaixadores por uma emissora pública.

Benedito Gonçalves afirmou que o então candidato a reeleição estava ciente da popularidade desse tipo de conteúdo na internet e utilizou a condição de presidente da República para gerar engajamento e manter uma mobilização política de caráter passional incapaz de aceitar contestações vindas de fora da bolha.

“Assim, no que diz respeito à tipicidade, a conduta se amolda à difusão deliberada e massificada por meio de emissora pública e das redes sociais de severa desordem informacional sobre o sistema eletrônico de votação e sobre a governança eleitoral brasileira em benefício de candidatura dos investigados”, afirmou.

“A extrema gravidade do uso indevido de meios de comunicação foi potencializada pelo uso dos símbolos da Presidência da República como arma anti-institucional, visando levar a atuação da Justiça Eleitoral ao completo descrédito”, completou o ministro Benedito Gonçalves.

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A um voto da inelegibilidade

Depois do voto do ministro Raul Araújo, na quinta (29), que concluiu que o evento com os embaixadores não foi considerado grave, os ministros Floriano Marques e André Ramos fecharam a penúltima sessão do julgamento determinando o placar de 3 a 1 pela inelegibilidade do presidente.

Os ministros procuraram rebater o argumento de Raul Araújo de que a decisão do colegiado não poderia se basear em todo contexto da campanha eleitoral, mas somente no evento para os embaixadores no Palácio do Alvorada.

Floriano Marques considerou que, naquele dia, o discurso de Bolsonaro, em si, era o suficiente para condena-lo, uma vez que teve “claro objetivo” estratégico eleitoral.

“O teor da reunião em nada condiz com matéria atinente às relações internacionais ou com nações estrangeiras. O tempo todo se falou se assuntos domésticos, do funcionamento da Justiça Eleitoral, dos predicados e defeitos dos candidatos, do curso de inquéritos policiais. Nada relacionado às relações com nações estrangeiras(…) Tal trecho se aproxima muito mais de um discurso de comício em praça do interior”, disse o ministro Floriano Marques.

Floriano ainda fez uma analogia para refutar o argumento da defesa de Bolsonaro de que o ex-presidente estaria amparado pelo princípio da liberdade de expressão.

“Alguém pode acreditar que a Terra é plana, mesmo contra todas as evidências científicas. Este sujeito pode integrar um grupo de estudos terraplanista, ou uma ‘confraria da borda infinita’ e dedicar seus dias a imaginar como um avião dá a volta no plano para chegar ao outro extremo. Porém, se este crédulo for um professor da rede pública, não lhe é permitido ficar a lecionar inverdades científicas aos seus alunos, pois isso seria desviar as finalidades educacionais que correspondem a sua competência de servidor docente”, disse Floriano.

O ministro André Ramos também.

Lucas Toth Vermelho

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