O caso Bruna Lícia e o linchamento moral da vítima nas redes sociais

28-01-2020 Terça-feira

Por Mônica Moreira Lima

Enquanto parcela significativa da sociedade continuar avalizando o genocídio de “mulheres adúlteras” viveremos esses tempos sombrios que já estão marcados como a era das trevas para o gênero feminino no país.

Na tarde do último sábado (25), um policial assassinou a esposa e um suposto amante, em sua residência, no Condomínio Pacífico I, na Vila Vicente Fialho, em São Luís- MA. Segundo informações policiais, o policial Carlos Eduardo Nunes Pereira praticou feminicidio seguido de homicidio, disparando 7 tiros na ex-namorada, Bruna Lícia, e no suposto amante dela, José William. O relacionamento do PM com Bruna, caracterizado como união estável, havia acabado recentemente, porém a vítima ainda dividia o mesmo teto com o assassino.

Indicado por feminicídio, o soldado da Polícia Militar, Carlos Eduardo, de 25 anos, também responderá pelo crime de homicídio.

Repercussão nas Redes Sociais

A repercussão nas redes sociais e, principalmente, os comentários de alguns internautas e ouvintes dos programas de rádios locais, chocam pela misoginia, machismo, sexismo e a mais absoluta falta de respeito pela dor das famílias das vítimas. São xingamentos e insultos que promovem a culpabilização da vítima, condenada a pena de morte por suposto crime de adultério, em pleno século XXI, por uma sociedade adoecida por valores patriarcais e pseudo-cristãos, fomentados por fascistas hereges que citam a bíblia para legitimar feminicídios, estupros e toda forma de violência perpetrada contra a mulher brasileira.

Essa legião de psicopatas fanáticos usa o “currículo sexual” da vítima para patrocinar seu linchamento moral nas redes sociais num segundo feminicídio, tão hediondo quanto o primeiro (físico), que é o crime de assassinato da reputação da mulher, impondo um sofrimento adicional aos familiares e amigos nesse momento de tamanha dor. Cadê a misericórdia e a piedade cristãs pregada por Jesus? Cadê a empatia ou a sororidade das mulheres, que emporcalham a honra da vítima nas redes, numa atitude covarde contra quem não pode mais se defender? Cadê o amor ao próximo de quem devia limpar a boca para falar o nome e Jesus? Essas mentes doentias e hipócritas são as mesmas que endossam a traição masculina rotineira, como necessidade fisiológica do machão brasileiro, eternamente no cio.

Por trás desses números crescentes e vergonhosos do feminicídio no Brasil está a impunidade. Exemplo clássico é o do cantor sertanejo Victor Chaves, “condenado” a 18 dias em regime aberto após espancar brutalmente a ex-mulher, na época grávida de 4 meses. O agressor ainda publicou um vídeo após a aberração jurídica que é sua sentença debochando da vítima e da justiça brasileira.

O Brasil e suas instituições judiciárias em todas as esferas, não têm uma legislação que enfrente a violência doméstica, o estupro e o feminicídio e puna esses crimes com o rigor que merecem, porque socialmente e religiosamente, a mulher ainda é vista com cidadã de segunda classe que veio ao mundo para servir e obedecer ao seu marido, dono do seu corpo e proprietário do seu destino.

Enquanto parcela significativa da sociedade continuar avalizando o genocídio de “mulheres adúlteras”, viveremos esses tempos sombrios que já estão marcados como a era das trevas para o gênero feminino no país.

OAB-MA e Fórum Maranhense de Mulheres repudiam agressões contra a vítima Bruna Lícia

Algumas entidades divulgaram notas repudiando a violência do caso que vitimou as duas pessoas. A primeira a lançar nota foi o Fórum Maranhense de Mulheres, que utilizou as redes sociais para divulgar o repúdio nas primeiras horas da manhã de ontem, segunda-feira (27). Já no fim da manhã foi a vez da OAB-MA.

A Ordem dos Advogados do Brasil – MA divulgou uma nota de repúdio sobre o caso. Confira:

“A Ordem dos Advogados do Brasil, seção Maranhão, por meio da Comissão da Mulher e da Advogada – CMA/MA, com o apoio da Comissão de Direitos Humanos – CDH/MA, vem a público, com profunda indignação, repudiar mais um crime de feminicídio e homicídio ocorrido no Estado. Neste sábado (25), Bruna Lícia Fonseca foi assassinada por seu companheiro, Carlos Eduardo Nunes Pereira, passando a integrar as estatísticas do crime de feminicídio do Estado. Em 2019, foram registrados 48 casos. Um aumento se comparado ao ano anterior, 2018, com 43 feminicídios. Em que pese a aproximação de um novo século, mais uma mulher é vítima da arraigada cultura patriarcal e violência extremada, que assola a nossa sociedade quando da notória opressão de gênero. O feminicídio é a triste consequência do machismo alicerçado na naturalização de comportamentos, que fazem pessoas acreditarem que diferenças sexuais respaldam superioridade de um gênero sobre o outro. A vida humana é feita de dissabores e escolhas. Violência não é solução, tampouco justificativa para as frustrações vividas. Diante tamanha atrocidade, não seremos complacentes com tamanho desrespeito à dignidade da pessoa humana e banalização da vida. Logo, REPUDIAMOS, de forma veemente, o ato brutal cometido pelo policial militar Carlos Eduardo Nunes Pereira – que tem direito à defesa e a um julgamento justo – assim como REPUDIAMOS todos os posicionamentos de culpabilização da vítima e que incentivam o julgamento e opressão do gênero. Expressamos nossa solidariedade às famílias das vítimas, Bruna Lícia e José Willian, na certeza de que a justiça será feita, assim como da continuidade do combate às violências que assolam a sociedade.” – Comissão da Mulher e da Advogada da OAB/MA

Além da OAB-MA, o Fórum Maranhense de Mulheres também emitiu nota. Confira!

FEMINICÍDIO E O ATO COVARDE DO ASSASSINO DE BRUNA ALICIA

Mais uma mulher vítima de feminicídio, desta vez foi Bruna Alícia uma jovem de pouco mais de 20 anos, assassinada de forma cruel, torpe, violenta, pelo seu marido. A crueldade se faz mais monstruosa ainda em virtude da forma como estão sendo veiculados matérias sobre o caso nas redes sociais. Grande parte delas destruindo a imagem da vítima, que passa a ser responsabilizada pela sua morte. Que é isso? Em que mundo estamos? Ainda estamos vivendo na idade média? Porque as mulheres continuam sendo vítimas desta cultura patriarcal que nos oprime e nos reduz a um órgão sexual que tem como finalidade apenas procriar e dar prazer aos homens, ao marido em especial.
Bruna Alícia está sendo destruída na sua moral e na sua integridade de ser humano. Mesmo sendo violentamente assassinada, ainda assim, não está sendo vista com humanidade que todo cristão merece. Sua morte não lhe dá paz, sua morte é justificada por um possível adultério que teria praticado.
Com esse argumento o assassino, seus amigos e uma parte da sociedade conservadora, machista, patriarcal e misógina, explica e justifica sua morte. “Foi merecida” dizem alguns e algumas que passam a inocentar o feminicida, naturalizando o crime hediondo praticado por este policial. O mais cruel de tudo isso é a lista que circula nas redes de amigos do assassino fazendo vaquinha para contratar um advogado para livrar este bandido da cadeia que merece.
Com esse tipo de prática os policiais demonstram o quanto são coniventes com a violência praticada contra as mulheres e o feminicidio. É surpreendente esta atitude, onde se viu uma coisa dessas, uma corporação estimulando a impunidade.
Nós, mulheres, que integram O FÓRUM MARANHENSE DE MULHERES, protestamos! Queremos justiça! Queremos uma policia preparada e não policiais desequilibrados que não sabem controlar seus impulsos assassinos.

Com informações do Jornal O Imparcial

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